Escolha Intertemporal

Rafael Bressan

Motivação

  • Frequentemente, renda e consumo ocorrem em momentos distintos.
  • Consumidores podem poupar para consumir em períodos subsequentes ou tomar emprestado para financiar consumo corrente com renda futura.
  • Nesse caso, precisamos estender nossa análise, considerando preferências sobre cestas em diferentes momentos do tempo e uma restrição orçamentária intertemporal.
  • As escolhas de consumo ao longo do tempo são chamadas de escolhas intertemporais.

Valor presente e valor futuro

  • Se pudermos tomar empréstimos e emprestar a uma taxa de juros \(r\), qual será o equivalente, no futuro, de $m atual?
    • Valor futuro: \(m(1+r)\)
  • E qual o valor presente de uma renda $m que receberemos no futuro?
    • Valor presente: \(\frac{m}{1+r}\)

Restrição orçamentária intertemporal

  • Consumidor escolhe o quanto consumirá de certo bem composto em dois períodos de tempo.
  • A renda deste consumidor recebida em cada período de tempo é denotada por \(m_1\) e \(m_2\).
  • Suponhamos de início que este consumidor só possa fazer poupança. No período 2 ele poderá consumir sua renda \(m_2\) mais o que poupou no período 1 com juros.
  • Então deve valer a seguinte restrição orçamentária para este poupador: \(c_2=m_2+(1+r)(m_1-c_1)\). Que pode ser reescrita na forma de valor futuro da RO. \[(1+r)c_1+c_2=(1+r)m_1+m_2 \qquad(1)\]
  • A inclinação da reta orçamentária é \(-(1+r)\).

Figura 1: Restrição orçamentária intertemporal

Restrição orçamentária intertemporal

  • O consumidor será tomador de empréstimos se \(c_1 > m_1\) e terá de pagar juros no segundo período.
  • A RO será: \(c_2=m_2-(1+r)(c_1-m_1)\). Que pode novamente ser apresentada na forma de valor futuro da RO.
  • Ou seja, desde que a taxa de remuneração da poupança seja igual à taxa de juros do empréstimo, a restrição orçamentária intertemporal será representada pela Figura 1.
  • A RO intertemporal também pode ser apresentada na forma de valor presente \[c_1+\frac{c_2}{1+r}=m_1+\frac{m_2}{1+r}\]

Restrição orçamentária intertemporal

Code
import matplotlib.pyplot as plt

# Definindo os parâmetros
r = 0.05
w1 = 100
w2 = 120
c1 = 60
c2 = 80

# Criando o gráfico
fig, ax = plt.subplots(figsize=(10, 10))
# ax.plot([0, w1+w2/(1+r)], [(1+r)*w1+w2, 0], label='Restrição Orçamentária')
ax.plot([0, w1], [(1+r)*w1+w2, w2], color='green', linewidth=3)
ax.plot([w1, w1+w2/(1+r)], [w2, 0], color='red', linewidth=3)
ax.plot([w1], [w2], 'bo', label = 'Dotação')
ax.annotate('Dotação', xy=(w1, w2), xytext=(w1 + 5, w2 + 5), ha='left', size=15)
ax.annotate('Poupança', xy=(w1-50, w2+50), xytext=(w1, w2+100), ha='center', size = 15, arrowprops=dict(arrowstyle='->'))
ax.annotate('Tomada de Empréstimo', xy=(w1+50, w2-50), xytext=(w1, w2-100), ha='center', size = 15, arrowprops=dict(arrowstyle='->'))
ax.annotate('Inclinação = -(1+r)', xy=(w1, w2), xytext=(w1+40, w2+40), ha='center', size=15)
ax.grid(True)
ax.set_xlabel('Consumo 1')
ax.set_ylabel('Consumo 2')
plt.show()

Preferências de consumo intertemporais

  • A convexidade de preferências é muito natural nesse contexto.
  • Ela diz que o consumidor prefere ter uma quantidade “média” de consumo em cada período.
  • Suavização do consumo
  • Dada a RO intertemporal e as preferências convexas de consumo nos 2 períodos, podemos examinar a escolha ótima do consumidor.

Figura 2: Tomador de empréstimos e poupador. Fonte: Varian (2015)

Preferências intertemporais

  • Preferências serão representadas por uma função de utilidade \(U(c_1,c_2)\)
    • \(U(c_1, c_2)=u(c_1)+\beta u(c_2)\). Onde \(\beta\) é um parâmetro de desconto.
    • \(U(c)=\sum_{t=0}^T\beta^{t}u(c_t)\), onde \(T\) é o número de períodos.
  • Para termos preferências convexas, a função utilidade instantânea \(u(c_t)\) deve ser côncava.
    • \(u''(c_t)<0\) para todo \(t\).
  • O parâmetro de desconto \(\beta\) deve ser tal que \(0<\beta<1\).
    • \(\beta\) mede a importância relativa do consumo no presente em relação ao consumo no futuro. Paciência do consumidor.
    • \(\beta\) menor implica em consumidor mais impaciente.

Exemplo

  • Considera uma função de utilidade instantânea logarítmica \(u(c_t)=\ln(c_t)\).
  • O problema do consumidor, em dois períodos, é:

\[ \begin{align} \max_{c_1,c_2} \quad & \ln(c_1)+\beta\ln(c_2)\\ \text{s.a.} \quad & (1+r)c_1+c_2=(1+r)m_1+m_2 \end{align} \]

  • Qual o valor do parâmetro de desconto intertemporal que torna o consumidor indiferente entre ser um poupador ou um tomador de empréstimos?

Solução

  • Como a função utilidade instantânea é côncava, podemos aplicar a condição de tangência.

  • \(TMS=1+r\). Logo \(c_2=(1+r)\beta c_1\).

  • Como desejamos \(c_1=m_1\) e \(c_2=m_2\), então \(\beta=\frac{m_2}{(1+r)m_1}\).

  • Podemos continuar a resolução dos consumos ótimos e obter:

    • \(c_1^*=\frac{m_1}{1+\beta}+\frac{m_2}{(1+r)(1+\beta)}\) e \(c_2^*=\frac{\beta m_2}{1+\beta}+\frac{(1+r)\beta m_1}{(1+\beta)}\)
  • É possível conferir que \(c_1^*=m_1 \implies \beta = \frac{m_2}{(1+r)m_1}\), como encontrado anteriormente.

Estática comparativa

  • Como o consumidor reagiria a uma mudança da taxa de juros?
  • A inclinação da RO será alterada e um novo ponto de tangência será encontrado.
  • A dotação é sempre acessível, logo a nova RO “gira” em torno da dotação.
  • Existem dois casos, dependendo se inicialmente o consumidor ser poupador ou tomador de empréstimos
    • Poupador: quando a taxa de juros subir o consumidor continuará sendo um poupador, \(c_1<m_1\)
    • Tomador de empréstimos: quando a taxa de juros cair o consumidor continuará sendo um tomador de empréstimos, \(c_1>m_1\)
    • Nos outros dois casos (poupador quando juros caem e tomador de empréstimos quando juros sobem), não podemos fazer afirmações.

Preferências reveladas

  • Caso de aumento de juros para um poupador.
  • Consumidor começa como poupador, sua cesta de consumo está à esquerda do ponto de dotação.
  • Se a taxa de juros aumentar, o consumidor nunca irá escolher um ponto a direita do ponto de dotação.
    • As escolhas à direita do ponto de dotação estavam disponíveis para o consumidor no conjunto orçamentário original, mas foram rejeitadas
    • Pontos que agora estão abaixo da RO original não serão escolhidos, pois a própria escolha inicial continua disponível.
    • O novo ponto de ótimo deve estar fora do conjunto orçamentário original.

Figura 3: Preferências reveladas. Fonte: Varian (2015)

💡 Este é o princípio da preferência revelada.

Estatística comparativa

  • Considere um tomador de empréstimos que se mantém nesta situação mesmo com um aumento da taxa de juros.
  • O aumento da taxa de juros gira a RO em torno da dotação.
  • Caso o consumidor continue na situação de tomador de empréstimos, ele estará pior que na situção original. 😠
  • Caso semelhante ocorre com o poupador que se mantém nesta situação mesmo com uma queda da taxa de juros.

Figura 4: Tomador de empréstimo piora com o aumento da taxa de juros. Fonte: Varian (2015)

📚 Bibliografia

VARIAN, H. R. Microeconomia: uma abordagem moderna. 9.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. Disponível em: app.minhabiblioteca.com.br/books/9788595155107