Restrição Orçamentária

Rafael Bressan

Microeconomia I (23MIC1)

Introdução à Teoria do Consumidor

  • Na primeira parte do curso estudaremos o comportamento dos consumidores.
  • O problema de um consumidor típico é definido como a maximização de seu bem-estar (utilidade), dadas as restrições que a escassez impõe sobre suas escolhas.
  • Dois objetos são fundamentais para especificar o problema do consumidor:
    • As preferências do consumidor - servem para definir sua utilidade ou bem-estar.
    • A restrição orçamentária - representa as restrições impostas pela escassez sobre esse consumidor.

Introdução à Teoria do Consumidor

  • As restrições impostas pela escassez são facilmente observáveis.
  • Se alguma mudança no comportamento do consumidor foi causada por alterações na sua restrição orçamentária, obtemos uma explicação objetiva e clara para essa mudança de comportamento.
  • Nesta aula estudaremos as restrições que o consumidor enfrenta quando maximiza sua função utilidade e que implicações sobre seu comportamento podemos derivar usando apenas as restrições de escassez.

Restrição Orçamentária

  • A restrição orçamentária representa a escassez no problema do consumidor.
  • Cada consumidor dispõe de uma certa quantidade de renda exógena para dispender em um determinado período do tempo.
  • O consumidor escolhe quais bens consumir e o quanto consumir de acordo com suas preferências, mas o valor total dos bens não pode ultrapassar sua renda.

Restrição Orçamentária

  • Vamos assumir que existam \(n\) bens nessa economia, com quantidades representados por \(x_1, x_2, \dots, x_n\).
  • Vamos supor, ainda, que os respectivos preços destes bens são dados por \(p_1, p_2, \dots, p_n\).
  • Por hipótse, os consumidores são tomadores de preços. Ou seja, os preços são fixos para estes consumidores e eles não podem alterá-los (existem modelos que relaxam essa hipótese).
  • A renda do consumidor é denotada por \(I\), e é exógena às ações do consumidor1.

Restrição e reta orçamentária

Restrição orçamentária

A restrição orçamentária de um consumidor pode, então, ser escrita como:

\[p_1 x_1 + p_2 x_2 + \dots + p_n x_n \leq I.\]

Ou seja, o consumidor não pode gastar mais do que sua renda.

A reta orçamentária é o conjunto de cestas de bens que custa exatamente \(I\): \[p_1 x_1 + p_2 x_2 + \dots + p_n x_n = I. \qquad(1)\]

Reta orçamentária

  • A expressão (Equação 1) é uma restrição linear.
  • De fácil compreensão, especialmente no caso de dois bens, o que permite uma visualização gráfica da restrição orçamentária.
  • A hipótese de dois bens não é tão restritiva quanto parece - se nosso objetivo é estudar a demanda de um tipo qualquer de bem, podemos agregar todos os outros bens em um bem composto.

Representação gráfica

  • Vamos ilustrar a restrição e a reta orçamentárias para o caso de 2 bens em um gráfico onde os eixos representam a quantidade dos bens consumidos.

  • Assuma que o consumidor disponha de uma renda \(I\) para alocar entre os bens \(x\) e \(y\).

  • Se \(p_x\) é o preço do bem \(x\), e \(p_y\) é o preço do bem \(y\), a restrição orçamentária deste indivíduo será dada por: \[p_x x + p_y y \leq I.\]

  • Portanto, se o consumidor gastar toda sua renda no bem \(x\), ele pode comprar, no máximo, \(I/p_x\) unidades deste bem.

  • De maneira similar, se toda a renda for alocada na aquisição do bem \(y\), ele poderá comprar, no máximo, \(I/p_y\) unidades deste bem.

Representação gráfica

Representação gráfica

  • Como evidenciado pelo gráfico, os pontos \(I/p_x\) e \(I/p_y\) são os interceptos da reta orçamentária.

  • A inclinação da reta orçamentária é igual à \(-p_x/p_y\) e informa o valor de troca de mercado entre os dois bens: para se obter uma unidade adicional do bem \(x\), temos que abrir mão de \(-p_x/p_y\) unidades do bem \(y\).

  • A inclinação da reta orçamentária é, portanto, o custo de oportunidade do bem \(y\), em termos do bem \(x\).

Representação gráfica

  • Suponha que o consumidor esteja consumindo \(x\) unidades do primeiro bem, e \(y\) unidades do segundo bem.

  • Caso ele decida aumentar o consumo do bem \(x\) em \(\Delta x\), deverá abrir mão de uma quantidade do bem \(y\), representada por \(\Delta y\), de modo que a reta orçamentária continue válida, ou seja: \[p_x (x + \Delta x) + p_y (y + \Delta y) = I.\]

  • Subtraindo a expressão anterior da reta orçamentária original, dada por \(p_x x + p_y y = I\), obtemos: \[p_x \Delta x + p_y \Delta y = 0 \implies \frac{\Delta y}{\Delta x} = -\frac{p_x}{p_y}.\]

  • O sinal negativo indica que para consumir um pouco mais do bem \(x\), o consumidor deve abrir mão de uma certa quantidade de bem \(y\).

Variações na renda e preços

  • Um aumento da renda desloca a reta orçamentária para fora, aumentando o conjunto de cestas de bens que o consumidor pode adquirir.

  • Uma diminuição da renda desloca a reta orçamentária para dentro, diminuindo o conjunto de cestas de bens que o consumidor pode adquirir.

  • No caso de aumento no preço de um dos bens, a inclinação da reta orçamentária se modifica.

  • Por exemplo, se o preço do bem \(x\) aumentar, a quantidade comprada deste bem com toda a renda disponível será menor.

Variações na renda e preços

Preços absolutos e preços relativos

  • Considere a seguinte restrição orçamentária: \(p_1 x_1 + p_2 x_2 + \dots + p_n x_n \leq I.\)

  • O que ocorre se todos os preços, incluindo a renda, aumentam?

  • Por exemplo, suponha que todos os preços dobrem de um período para o outros. Portanto: \[(2p_1) x_1 + (2p_2) x_2 + \dots + (2p_n) x_n \leq (2I).\]

  • Dividindo os dois lados da inequação por 2, temos que a nova restrição orçamentária é idêntica à original: \[p_1 x_1 + p_2 x_2 + \dots + p_n x_n \leq I.\]

Preços absolutos e preços relativos

  • Intuitivamente, se todos os preços da economia aumentam (ou diminuem) na mesma proporção, incluindo salários, então, nada muda.

  • A restrição orçamentária continua a mesma, apenas expressa em valores diferentes.

  • Então, o problema do consumidor não sofre alterações e ele escolherá a mesma cesta de bens que escolhia antes do aumento geral de preços.

  • Portanto, mudanças nos preços absolutos não têm efeito real na economia. Dito de outra forma, os agentes econômicos não sofrem de ilusão monetária.

  • Apenas mudanças nos preços relativos têm efeitos reais, isto é, quando o preço de um bem aumenta (ou diminui) em relação ao preço de outro bem.

Preço-numerário

  • Podemos, então, transformar um dos preços da economia em numerário (o que significa normalizá-lo em 1).

  • Por exemplo, se adotarmos o preço do bem \(x_1\) como preço-numerário, a restrição orçamentária ajustada será dada por: \[x_1 + \frac{p_2}{p_1} x_2 + \frac{p_3}{p_1} x_3 + \dots + \frac{p_n}{p_1} x_n \leq \frac{I}{p_1}.\]

Racionamento

  • Suponha uma economia com dois bens onde o governo decide racionar o consumo de um dos bens (sem perda de generalidade, o bem \(x_1\)).

  • Cada consumidor pode comprar, no máximo, \(\bar{x}_1\) unidades do bem 1, ainda pagando o preço \(p_1\) para qualquer quantidade \(x_1 \leq \bar{x}_1\).

  • Acima da quantidade \(\bar{x}_1\), o consumidor não pode mais adquirir este bem.

Racionamento

  • Podem ocorrer duas situações:

  • \(\bar{x}_1 \geq I/p_1\): não há alteração na reta orçamentária. Esse caso é irrelevante, o governo está fixando um valor de racionamento muito alto, que não afeta a restrição orçamentária dos agentes (imagine o governo restringindo a compra de BMWs para no máximo 10 unidades por consumidor).

  • \(\bar{x}_1 \leq I/p_1\): nesse caso, o consumidor pode consumir o bem 1 normalmente até o nível \(\bar{x}_1\). A partir desse nível, não é mais possível consumir este bem. Portanto, ocorre uma quebra da reta orçamentária no nível \(\bar{x}_1\) de consumo do bem 1.

Racionamento

Code
import matplotlib.pyplot as plt
import numpy as np

# Define the parameters
p1 = 2
p2 = 1
I = 10
x1bar = 4

# Define the range of x2
x2 = np.linspace(0, 10, 100)

# Define the budget line
x1 = (I - p2*x2)/p1

# Define the rationed budget line
x1_rationed = np.minimum(x1, x1bar)

# Plot the budget line and the rationed budget line
fig, ax = plt.subplots(figsize=(10,6))
ax.plot(x1, x2, linestyle='--', label='Reta Orçamentária')
ax.plot(x1_rationed, x2, color = 'darkgreen', label='RO com Racionamento')
ax.fill_betweenx(x2, x1_rationed, 0, where=x1_rationed>0, color='darkgreen', alpha=0.3)
ax.set_xlabel('$x_1$')
ax.set_ylabel('$x_2$')
ax.legend()
plt.show()

Restrição orçamentária na presença de racionamento

Tributação por nível de consumo

  • Existem certos bens que possuem preços que variam de acordo com a quantidade consumida (e.g., energia elétrica, água)

  • Para um consumo pequeno de água, o governo cobra um preço menor por litro consumido do que o preço cobrado para consumos maiores.

  • Motivação: evitar desperdício, beneficiar a parcela da população mais pobre que costuma consumir menos água na média, etc.

  • Suponha, então, o seguinte cenário: se a quantidade consumida do bem \(x_1\) está na faixa \([0,\bar{x}_1]\), então, cobra-se um preço igual a \(p_1\). Se a quantidade consumida for superior à \(\bar{x}_1\), cobra-se um preço \(p'_1\), sendo \(p'_1 > p_1.\)

  • Neste caso, há uma quebra da reta orçamentária em \(\bar{x}_1\), refletindo a mudança de preço a partir desse nível de consumo.

Taxação por nível de consumo

Restrição orçamentária e tributação

📚 Bibliografia

NICHOLSON, W.; SNYDER C. Teoria microeconômica: Princípios básicos e aplicações. Cengage Learning Brasil, 2019. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788522127030/

VARIAN, H. R. Microeconomia: uma abordagem moderna. 9.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/books/9788595155107